terça-feira, fevereiro 07, 2012

Nota a Bandnews: a falsa guerra entre usuário, motorista e ciclista

Na manhã do dia 4 de Fevereiro, a jornalista Francielle Colpani promoveu um debate na Rádio Bandnews sobre o aumento dos acidentes de trânsito relacionados com o transporte coletivo. A discussão girou em torno de acusações entre funcionários e usuários do transporte coletivo, sem aprofundamento em questões como o aumento da velocidade média dos ônibus e a estagnação da frota. O Movimento Passe Livre há tempos vem discutindo esse assunto e por isso tentamos participar do debate através do canal do twitter, meio utilizado largamente pela Rádio. Porém, nosso comentário parece ter sido ignorado e, em vista disso, decidimos escrever essa nota à Francielle Colpani, à Radio Bandnews e a seus ouvintes.


A falsa polêmica entre motoristas de ônibus, usuários e ciclistas


Com a licitação fraudulenta do transporte coletivo de Curitiba, o contrato implantado prevê aumento na velocidade média dos ônibus em meio urbano. Não é de se espantar que tal fato vem provocando um aumento de acidentes com o transporte coletivo na cidade. Esses acidentes envolvem não só ciclistas, mas também pedestres, motociclistas e até usuários de automóveis.

Mesmo assim, a máfia do Transporte Coletivo Modelo vende o aumento de velocidade como chave da eficácia do sistema, impondo ao motorista velocidades médias maiores, sob pena de multas e descontos em seus salários. O resultado é uma viagem cheia de solavancos e reclamações de usuários, quando não desemboca em acidentes.

O lucro ou as pessoas?

Por trás do discurso da eficácia, se esconde a tentativa de transportar mais gente sem haver necessidade de aumentar a frota de ônibus. Dessa forma, aumentando sua velocidade média,
não há necessidade de investimento em aumento da frota ou na contratação de novos trabalhadores para operar o sistema e, assim, o lucro só continua a subir.

Alguém pode contra-argumentar imediatamente: “Como assim? Curitiba recebeu 554 ônibus novos!” O que ocorreu, na verdade, foi uma substituição de frota. Ônibus sucateados, que possuíam excessivo custo de manutenção, foram substituídos por ônibus novos. Os velhos, em estado precário, geralmente são passados para o interior do estado, servindo a cidades menores ou ao transporte escolar rural, capilarizando a dominação da máfia para o interior do estado. Não por acaso, atualmente há uma pressão das prefeituras do interior para aumentar a remuneração para estes serviços.

[sobre a expansão/ interiorização da máfia, veja http://www.gazetadopovo.com.br/vidaecidadania/conteudo.phtml?tl=1&id=1218790&tit=Transporte-escolar-pode-parar-na-Justica]

A ameaça chamada bicicleta vai pra baixo do busão

É neste momento que entra a questão dos ciclistas. Com uma política de exclusão a qualquer outro modal que não seja o do transporte individual motorizado, é impossível deslocar-se de forma segura de bicicleta, ônibus ou mesmo a pé. Da mesma forma que o sistema BRT (Bus RAPID Transit), as ciclovias existentes em Curitiba são em sua maioria obra de Jaime Lerner e objetivam o lazer dos ricos. Praticamente todo o espaço restante relativo à mobilidade é destinado aos carros e não há vias cicláveis para deslocamento ao trabalho. Por incrível que pareça, as canaletas que estão matando ciclistas (e também pedestres) são mais seguras que as ruas dimensionadas exclusivamente para carros.

Para resolver o problema do déficit de ciclovias e proteger a máfia do transporte coletivo modelo dos processos de responsabilidade civil, o braço legislativo da máfia, na câmara de vereadores, criou uma lei proibindo os ciclistas de utilizar a canaleta. Essa medida não é para proteger o ciclista, mas para isentar o empresário. Para preservar o ciclista, é necessário mais vias cicláveis. Como dissemos e repetimos, a legislação municipal é construída para excluir quem não alimenta o capital. O ciclista que ousa expor-se para colaborar para uma cidade mais limpa e acessível estará por sua conta e risco, enquanto a máfia do transporte coletivo modelo estará protegida pela lei.

Recentemente, uma ciclovia foi feita no Boqueirão, margeando a canaleta. Porém, nota-se claramente que a obra eleitoreira serve apenas para beneficiar empreiteiras e cumprir com o marketing da cidade modelo, mesmo que sua estrutura seja mal feita e extremamente perigosa.

Povo X povo: quem ganha é a máfia do transporte

Infelizmente, a falta de uma visão política mais aprofundada acaba alimentando uma falsa polêmica entre ciclistas, usuários de ônibus e trabalhadores do transporte coletivo. Porém, o verdadeiro conflito não é entre eles, mas entre eles e a máfia do transporte coletivo modelo. O cicloativista deve perceber que a cidade modelo de exclusão lhe afeta e coloca sua vida em risco, da mesma forma que os trabalhadores do transporte devem denunciar o nível de exploração a que estão sujeitos, aliando-se aos movimentos populares. Promover a falsa guerra de trabalhador contra trabalhador é uma velha estratégia da classe dirigente, que ainda é bem alimentada nos dias de hoje.

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